AS PROVAS E AS CITAÇÕES

Já se vai um longo caminho no tempo entre a Enfermagem de Florence e a que temos hoje. Mudaram as praticas, mudaram os pensamentos, mudaram as posturas.
Lembrei- me de falar sobre isso por conta da correção da avaliação dos alunos de 1°e 3° período do curso de Enfermagem. Por mais que explique os motivos, muitos ainda revoltam-se com a exigência acadêmica de se realizar citações e referências em seus textos.
Numa visão particular entendo as citações como uma forma de confirmar, validar e generalizar o pensamento para além dos domínios particulares. Utilizar citações promove um dialogo entre o que se sabe por vivenciar ou ouvir falar e a mensagem que se quer passar e as teorias, pensamentos, pesquisas, abordagens dos que vieram e fizeram antes. Porém as citações devem ajudar a dizer o que se pretendo e não substituir o que se quer e precisa dizer. A mensagem é e deve ser do autor e não das citações, no caso o autor que se usa como referência.
As leituras servem para aprimorar o pensamento, refletir as experiências e vivências. O que se vive, as experiências, os conhecimentos prévios são sempre importantes, mas não devem ser a única fonte para subsidiar a construção do saber pessoal. Paulo Freire, em a pedagogia da Autonomia, diz que o conhecimento prévio deve ser respeitado, porém superado, reconstruído. “a superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrario, continua a ser curiosidade, se criticiza.” (FREIRE, 2006. p.31)
Digo tudo isso porque na minha graduação também me revoltava com a exigência de citações e referências. Pensava que minha “opinião” era ou deveria ser o suficiente para que “minha verdade” fosse aceita. Ninguém me explicou que a verdade continuaria sendo minha, que a citação do pensamento de outra pessoa me engrandeceria ao invés de me diminuir, pois estaria reconhecendo o que outros pensaram antes de mim. Citar os autores com os quais concordo é um sinal de inteligência e humildade, coisa necessária a qualquer acadêmico, qualquer um que pretenda um trabalho intelectual.
Hoje tenho muito orgulho de poder escrever e citar Paulo Freire, Eymar Vasconcelos, Eduardo Stotz, Victor Valla, Julio Wong Un, Waldenez de Barros, Maria Cecília Minayo e tantos outros intelectuais comprometidos com a transformação do mundo.
Li muitos textos esta semana, pois as provas na Faculdade são textos. Alguns muito bons em forma e conteúdo. Outros nem tanto. Alguns com mais de 10 citações. A maioria com ao menos 3 referências diferentes. Porém alguns poucos alunos ainda insistem em não utilizar nenhuma referência. Querem impor a sua opinião como se nada tivessem que aprender na academia. Em alguns casos a “opinião” já vem “modificada” pela vivência acadêmica, mas na maioria não. Continua sendo opinião acrítica.
Alguns estudantes ainda não se deram conta que a enfermagem mudou, que é uma arte sim, mas que também é uma ciência e precisa ser tratada como tal. Infelizmente alguns ainda pensam que para ser enfermeiro qualquer um serve, que basta boa vontade e amor ao próximo. Outros imaginam que saber a prática, fazer procedimentos, curativos, aplicar injeção, fazer banho no leito, dar medicação e, pior ainda, saber dar ordem, basta. Faz muito tempo que ser enfermeiro mudou e saber só isso não basta. Ser tarefeiro não é aceitável na Enfermagem de hoje.
Apesar dessa postura em defesa da Enfermagem enquanto ciência, não deixo de valorizar o saber e as práticas populares. Tanto que certa vez um aluno criticou-me dizendo que ensinava muito achismo, isso por conta de defender a prática de parteiras, benzedeiras, rezadeiras, padres, pastores e pai e mãe de santos.
Defendo-me dizendo que todos os saberes são importantes, que não há um que seja mais digno que outro. E isso, só para constar, nem fui eu que pensei sozinho, é de Paulo Freire e que orgulho tenho de citar esse Mestre.
REFERENCIAS:
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. 34 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
Comentários